Sobre: Uma coluna para falar tudo sobre nada

Geral


Sobre o tamanho da empatia dos brasileiros 
e o brilho no olho da senhora na Cohab Chris


Paulo Nakayama

14/05/2024 - Brasileiro é um povo barulhento. A gente grita, fala palavrão, mastiga com a boca aberta. A gente não tem vergonha de sambar no meio da rua e está pronto para briga, quando brigar é necessário. O brasileiro é aquele moleque mal educado, que não sabe se comportar à mesa quando as visitas chegam em casa.
Mas o brasileiro, do alto de todos estes defeitos, tem uma coisa rara no resto do mundo: a capacidade de sofrer com a dor dos outros. Brasileiro não pensa duas vezes quando a casa está pegando fogo e corre para dentro para salvar quem lá estiver. Tira da mesa a comida para repartir com quem precisa quando a coisa aperta.
É essa generosidade despretensiosa que observamos agora: impressionante ver a sociedade toda mobilizada diante da tragédia que consome, todos os dias, pedaços inteiros do Rio Grande do Sul. Bonito como nós nos mobilizamos para nos ajudar. Sem esperar nada em troca, sem fazer alarde, sem publicidade.
O povo brasileiro tem essa capacidade de se condoer com o sofrimento do próximo. Não espera muito do Estado quando a situação complica. Toma as rédeas e faz as coisas acontecerem. Do seu jeito. É assim que moldamos nossa sociedade. Foi sempre assim. Durante a pandemia, em vários momentos trágicos de nossa história. É assim hoje.
Dá orgulho ver que aqui em Tupã, a mais de 1300 quilômetros dos pontos mais críticos da catástrofe gaúcha, a maior parte da população está engajada e ajudando como pode. Um fardo com garrafinhas de água, um pacote de macarrão, uma peça de roupa. Esse movimento espontâneo mostra que aqui, de fato, ninguém solta a mão de ninguém.
Vendo os meninos do Tiro de Guerra e tantas outras pessoas ajudando a coletar donativos no final de semana passado, lembrei do brilho nos olhos de uma senhora que morava na zona Leste da cidade no começo dos anos 2000.
Naquela época, capitaneados pelo jornalista Jota Neves, fazíamos parte de um grupo de voluntários que coletava mantimentos para montar cestas básicas e distribuir a quem precisasse. Batendo de casa em casa, íamos juntando o que nos dessem e, sempre, éramos muito bem recebidos pela população.
Numa manhã de sábado, fui convidado a entrar em uma casinha na Cohab Chris. A moradora, solícita, ouviu minha história e disse que queria ajudar. Me ofereceu água e café e depois foi até a cozinha, de onde voltou com um pacote de arroz de cinco quilos aberto, dizendo que era tudo que tinha. "Tirei só dois copos, mas pode levar o resto", disse.
O brilho no olho era reflexo do que estava no interior dela. Aquele fogo de bondade que acende por dentro e resplandece. Uma luz que brilha inversamente proporcional à modéstia da pessoa. Quando mais pobre, mais forte. 
O pacote de arroz da senhorinha valia uma tonelada. Aquele pacote de arroz amarrado com barbante, para mim, valeu ainda mais: me ensinou que, quando se é bom, nada mais tem tanta importância. 
"Tem quem precise, né, filho?", indagou a mulher, sorrindo um sorriso que só tem quem está perto do nirvana. Respondi que sim, engoli um soluço e sai, contendo as lágrimas. Não é todo dia que a vida nos mostra com cores tão vivas que a felicidade, realmente, não se compra. Quase sempre, vem de graça.

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