26/03/2025 - Uma dúvida que volta e meia aparece junto à vontade de viajar para o Reino Unido ou Austrália, e muitas vezes gera medo e ansiedade, é aquela: por que nesses lugares se dirige com o volante do lado direito? A resposta não é curta nem linear e remonta a velhos tempos. Há diferentes versões e até um livro que investiga o tema: “Ways of the World: A History of the World’s Roads and the Vehicles that Used Them”, de Maxwell Gordon Lay.

A primeira coisa a se ter em mente é que os moradores do Reino Unido e da Austrália estão longe de serem os únicos a dirigir com o volante “do outro lado”. De fato, 75 países atualmente seguem esse costume e, de acordo com um estudo da Universidade de Frankfurt, um quarto das estradas do mundo são projetadas para o tráfego pela esquerda.

Segundo Lay, os países onde a direção é feita pelo lado esquerdo da via são territórios que adotaram a regra porque eram antigas colônias britânicas ou por causa da proximidade geográfica com alguma delas. Mas de onde vem a regra e por que ela mudou no resto do mundo?

 

Origem em montaria

Em relação à primeira questão, existe uma teoria segundo a qual, na Roma antiga, a maioria dos destros montava cavalos com a mão esquerda e precisava manter a mão direita livre para lutar, se necessário.

“Os exércitos romanos marchavam no lado esquerdo da estrada, e essa é a convenção que permaneceu”, explicou Stephen Laing, curador do Museu Britânico do Automóvel em Warwickshire, em uma entrevista à BBC.

O costume continuou na Europa durante a Idade Média, quando os cavaleiros que viajavam pelas estradas seguravam as rédeas de suas montarias com a mão esquerda e deixavam a direita livre.

“Com o aumento do tráfego, cavalos e carruagens ficaram no lado esquerdo. Quando os carros apareceram pela primeira vez, eles eram como carruagens sem cavalos, então eles também dirigiam no lado esquerdo”,  acrescentou Lang.

Por fim, o hábito se tornou lei e foi exportado para colônias britânicas ou para territórios sob sua influência. No Japão, por exemplo, as ferrovias foram projetadas por engenheiros britânicos. Assim, estima-se que no final de 1700 as carruagens circulavam pelo lado esquerdo da estrada na maior parte do mundo.

 

As primeiras 

exceções à regra: França e EUA

Quanto à questão de quando e por que a regra mudou, existem várias teorias, mas não há certeza absoluta. Uma delas identifica a França e os Estados Unidos como cenários de grandes mudanças.

Na França, o evento que desencadeou o movimento para a direita foi a Revolução Francesa. Tradicionalmente, as pessoas de boa condição social viajavam com suas carruagens pelo lado esquerdo. Em um contexto de transformação social (última década de 1700), houve quem, para enfrentar os velhos costumes e ir contra as classes altas e abastadas, passasse a circular pelo centro e pelo lado direito das estradas. A ideia seria “se misturar às classes mais populares”. Foi neste contexto que se registrou um aumento significativo no transporte de mercadorias e passageiros, exigindo carruagens maiores, com mais cavalos e, por isso, mais difíceis de manobrar.

Vários países do velho continente decidiram seguir o exemplo da França. O Reino Unido, no entanto, optou por manter seu sistema. Nos Estados Unidos, que continuaram por um tempo sendo uma colônia britânica, o uso de carruagens maiores para transportar mercadorias e passageiros também se tornou popular. Em particular, a Conestonga, uma carroça pesada e coberta que media quase seis metros de comprimento e tinha capacidade de carregar até seis toneladas, puxada por vários cavalos, mulas ou bois.

Uma de suas características era a ausência de cabine para o condutor, que montava no último animal do lado esquerdo para controlar os demais com um chicote na mão direita. Por esse motivo, o trânsito teria começado pelo lado direito da via, já que, estando do lado esquerdo, tinha uma melhor visão das carruagens que vinham no sentido contrário. Nesse sentido, foi o crescimento desse meio de transporte que obrigou as autoridades a mudar o rumo das viagens, a fim de tornar a direção menos perigosa. A nova regra também se aplica ao resto do continente norte-americano.

 

Outra teoria

Há também a teoria de que, com a Declaração de Independência dos Estados Unidos em 1776 e a intenção de cortar todos os laços com seus antigos soberanos, foi tomada a decisão de mudar o sistema implementado para a circulação.

Oficialmente, a lei do volante do lado direito foi assinada em 1792 e passou a vigorar em 1804. Com seu icônico Modelo T, a Ford foi uma das primeiras — e por anos a única — montadoras a adotar o volante do lado esquerdo. Foi somente com a Segunda Guerra Mundial e a ratificação da Convenção de Genebra sobre Trânsito Rodoviário que a troca oficial do volante se tornou obrigatória.

Na Argentina, a mudança no sentido do trânsito foi decretada oficialmente em 10 de junho de 1945.

A indústria automobilística nacional naquela época era claramente influenciada pelos Estados Unidos, de onde vinha a maior parte dos carros. Outro motivo era que o sistema de direção pela esquerda já havia sido implementado no Brasil — e acidentes e atrasos no trânsito ocorriam nas travessias de um país para o outro.

 

Veja abaixo a lista de países e territórios em que os carros têm volante do lado direito:

· Na África: Botswana, Lesoto, Quênia, Malawi, Maurício, Moçambique, Namíbia, Santa Helena, Ascensão e Tristão da Cunha.

· Na América do Norte: Bermudas.

· América Central e Caribe: Anguilla, Antígua e Barbuda, Bahamas, Babados, Dominica, Granada, Ilhas Cayman, Ilhas Turks e Caicos, Ilhas Virgens Britânicas, Ilhas Virgens Americanas, Jamaica, Montserrat, São Cristóvão e Nevis, São Vicente e Granadinas, Santa Lúcia e Trinidad e Tobago.

· América do Sul: Guiana, Ilhas Malvinas (Falklands), Suriname.

· Ásia: Bangladesh, Brunei, Birmânia, Hong Kong, Índia, Indonésia, Japão, Macau, Malásia, Maldivas, Nepal, Paquistão, Cingapura, Sri Lanka, Tailândia, Território Britânico do Oceano Índico e Timor Leste.

· Europa: Akrotiri e Dhekelia, Chipre, Bailiado de Guernsey, Irlanda, Ilha de Man, Bailiado de Jersey, Malta e Reino Unido.

· Oceania: Austrália, Fiji, Ilhas Salomão, Ilhas Pitcairn, Kiribati, Nauru, Nova Zelândia, Papua Nova Guiné, Samoa e Tonga.